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quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Prefácio para Algibeira Brasileira

Você encontra o livro de André Gusmão aqui


Sem dúvida é uma algibeira o que esse frequente escritor carrega consigo. Sem tranca, sem tampa, cordão frouxo que seja. Os bens que guarda aqui na verdade nos apresentam um homem a abrir a guarda sem medo do flagrante que o revela completamente humano — seguro, frágil, temeroso, imprevidente, esperançoso, destemido, sonhador, impulsivo, cego, lúcido.

André Gusmão costura no corpo, como um saco preso à roupa, toda a sua bagagem. Carrega em suas andanças os constantes apelos à felicidade, que, por vezes, talvez ainda pense encontrar no outro. “Ela tinha o amor estampado na cara”, mas ele desconfia de que seu “espelho” o traz de volta a si mesmo, à compreensão de sua história. Conhecendo-se mais, torna inesgotável sua capacidade de sentir o outro e de se fazer percebido.

Ao leitor de Algibeira Brasileira é dada a força das verdades do autor, de seus confessos tropeços, de seus comemorados soerguimentos. Isso não e tudo, porém. André brinda seu público com a beleza das imagens forjadas por um discurso que se desloca — durante o tempo em que amealha ideias e sentimentos — de um português nascido nos sonhos cultivados em terras brasileiras para a mesma língua em velhas vestes, sotaque de além-mar.

Aglacy Mary 

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Pé esquerdo

Um chão de Córdoba - Espanha
Foto: Aglacy Mary


Dizem-me as pedras,
Descobrindo meu calcanhar,
Que um dia indaprendo
Os chãos que devo pisar.



sábado, 24 de dezembro de 2011

A quem educa boiada

 
Que quer um pai quando ao filho
entrega a sorte de ser
um boi a mais na boiada?
Se é mais fácil se iludir
no conforto de dizer
que o rebento vai ter companhia,
difícil será resgatar
um nome no meio do pasto,
um jeito de ser singular
no meio da zona plural.
Agora o que vale é a marca,
forjada a ferro ou a sedução,
Feito aquele jeans da moda. 
Agora são todos iguais...
Não que tenham mais direitos,
mas porque mesmo os defeitos
são produzidos em moldes.
Agora são todos felizes,
com planos onde não cabe o humano.
Ser gente vai ao nível do impossível,
ter ética passa a ser bem do passado.
Ainda queimo os miolos
para dar resposta à questão:
que quer um pai quando ao filho
entrega a sorte de ser 
um boi a mais na boiada?

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Fissura

Marbella - Málaga

Li nos seus olhos o gosto por mim. 
Era coisa parecida com o apego de Rosário
pelo feijão que secou antes de fazer pé.
Sua lágrima era pouca;
sua boca, quase o vão seco que corta o sítio
lembrando dias frescos, 
molhados de prazer.

Leia também Pedagogia não.

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Festa na janela


Vejo um bem-te-vi bem-me-vendo por aqui.
Ver a ele não basta;
Bate no vidro e acusa que viu.
Mas não lhe bastando que eu saiba,
Sai levando notícia do achado,
E logo vejo mais três,
Do mesmo tipo, que bem-me-veem.
Será isso ou será somente
Que gostam do rio que me passa
E do mar que me ondeia?
Na dúvida, deixo uma árvore
Bem na beira da janela.
Bem-te-vi fazendo festa
Será por mim? Será pra ela?

domingo, 18 de setembro de 2011

A bolsa


O supermercado estava cheio. Parece que, em tempo de quaisquer vacas, gordas ou moribundas, aquele ambiente imantado atrai todo metal que carregamos em nossas carteiras. A realidade de poucos caixas abertos fazia com que as pessoas se apressassem para chegar à fase final da tarefa, imaginando que, quanto mais demorassem mais risco haveria de serem as últimas de uma fila que crescia.

O relógio já corria para alcançar a hora da novela dela, e isso a apressara de modo que dispensou o carrinho de compras na entrada. “Carrinho pra quê? Levo só umas besteirinhas hoje”, planejou a moça consigo mesma. Tez branca; cabelos castanhos provavelmente de alguma tintura e lisos certamente de alguma escova; olhos amendoados; lábios carnudos bem rosados, de um rosa acentuado por um gloss generosamente aplicado. Passeou objetivamente pelos corredores da loja. Um par de sandálias para os pés, que me pareceram um tanto inchados; um ovo de Páscoa daqueles grandes e de preço constrangedor; uma tábua de frios; um queijo francês que uma amiga minha chamaria de queijo estragado; duas escovas de dente; um frasco de enxaguante bucal; um esmalte vermelho tango; uns olhares ao redor, para talvez notar alguma nova necessidade.

A fila se estendia para fora do corredor de pequenas compras e atingia a seção de vinhos, o que a fez lançar mão de uma garrafa que me pareceu um Luis Pato e me fez sentir saudade de um lugar onde não estive. Enquanto a fila andava, ela fazia algum malabarismo para equilibrar os produtos que queria levar mais a bolsa com que entrara — uma daquelas invenções que a mulher não consegue pendurar no ombro.

Ele vinha observando seus movimentos desde a seção de higiene e cosméticos, quando ela quase derrubou o esmalte. Ali começou a vislumbrar algo. Era bem moço ainda, talvez recém-saído de uma escola de Ensino Médio. Cabelos curtos e bem cuidados; calça jeans escura, camisa de malha bem assentada em seu tronco comprido; sorriso largo, porém raro. Outro rapaz o acompanhava, e os dois trocaram algumas palavras enquanto o primeiro olhava a moça já na fila, a bolsa mal colocada numa das mãos, deixando expostos vários bolsinhos supostamente protegidos por fecho éclair. Ele se adiantou à posição dela sob o pretexto de alcançar um item qualquer numa prateleira mais à frente dos dois. Notou que ela estava indefensável com aquele pequeno amontoado de coisas. O modo como segurava a garrafa de vinho, presa entre o antebraço e o peito esquerdos, era garantia de que a bem jovem senhora teria pouca reação caso fosse abordada. Ela, entretanto, sentia-se segura naquele lugar onde todos pareciam providos de meios de pagar suas mais sofisticadas compras — até mesmo rapazes tão jovens. “Hoje em dia até criança já carrega um cartão no bolso”, pensava ela enquanto, num relance, notou o garoto atento, mirando especialmente sua bolsa. Inquietou-se.

Dali até os dois minutos seguintes, ela viveu uma eternidade de desconforto. Em vão tentou redistribuir os objetos em suas mãos e garantir a segurança da bolsa. “Não seria melhor fazer algum barulho e chamar um segurança? Mas onde eles estão mesmo? Quem diria que aqui dentro alguém correria um risco deste tipo? Pensando bem, ele não será louco de tentar qualquer coisa. Seria preso uns dez passos adiante, certamente. Pelas próprias pessoas da fila. Devo despreocupar-me enquanto estiver aqui. Mas e a saída?” A mulher começou, então, a atormentar-se em planos para o deslocamento até o carro, no estacionamento do supermercado. “Só me afasto do caixa com um guarda”. Estava decidido.

Quando praticamente voltava à calma, notou que o rapaz se afastara e agora retornava à fila, espremendo-se entre as pessoas, que pareciam não querer dar-lhe passagem. Ele continuava vindo, ela sem iniciativa, ele se aproximando, ela se desesperando. Até que ele chegou. “Que coragem!”, a moça quase exclamou em voz alta e virou totalmente de costas para o início da fila, mostrando ao garoto que estava bem atenta ao seu movimento. Ele, porém, não se intimidou. Colou nela, prendeu uma cestinha de compras em sua mão direita e disse: “Melhor colocar suas coisas aqui, moça”. Na saída, cada um seguiu seu rumo. Ela tem um “muito obrigada” preso na garganta até hoje.

EnsaiOlhográfico

Foto emprestada de um álbum de Rísia Rodrigues

Nem sempre
é a câmera quem fisga o olho.
Há olhos
que hipnotizam a máquina.

quinta-feira, 28 de julho de 2011

Velhas águas

Foto: Aglacy Mary
Vista do Restaurante do Camilo - Coroa do Meio | Aracaju-SE

Habita-me a canoa de Seu Lisboa
Forjada nos livros queimados
Nas cartas abertas
No homem plantado do outro lado da rua
A tentar decifrar atitude suspeita
Habita-me sua estratégia
Saída das águas do constrangimento
Para barquear em terra firme
Onde a vida só voltou a oscilar
Cheia de histórias
Na arte de madeira e vime
Daquela cadeira de balanço
Agitando as ideias
De quem lhe teve ouvidos


Do meu livro, "A Lavra", que dá nome a outro poema.

terça-feira, 26 de julho de 2011

Certeza


Foto: Aglacy Mary

Por hoje
me basta saber
que o sol
de amanhã
pode
não nascer

terça-feira, 12 de julho de 2011

Sombra

Pça. São Franciso - São Cristóvão-Sergipe-Brasil (08.07.2011)
Foto: Aglacy Mary

E logo no outro instante
A sombra se aclara
E inventa tudo de novo
E me adentra 
E me faz d'ouro

terça-feira, 21 de junho de 2011

Céu de junho


Pedaço de céu de Aracaju/Foto: eu mesma

Se Volpi não pinta bandeirinhas,
ainda assim, são elas que vejo
em seus traços coloristas.
Entre um sacolejo de peneira, 
duas rodadas de babado
e uma pisada,
olho pro céu, meu amor.
É dele que chovem 
sanfona e pandeiro.

Você pode ir para Medida.

sábado, 18 de junho de 2011

Em tempo


Vislumbrando o lado de lá


Agora que me pouco tristo, 
O morro é leve
Inda que a vida 
Breve.

sexta-feira, 20 de maio de 2011

Um dia de tonhice


Considerando a formação do grupo que combinara o passeio, o final de semana prometia, no mínimo, horas aprazíveis. Tudo acontecia conforme o previsto. Meire encontrou os três com exatas duas horas de atraso, não frustrando expectativas de ninguém. Leninha, a... digamos que a cabeça do grupo, era quem sugeria os programas e organizava o que fosse preciso. Com ela por perto, sistemática e sempre bem orientada, tudo funcionava conforme o combinado. Até a espera impaciente pela amiga, que lhe serviria de co-piloto, embora completamente desqualificada para a função, pois Meire era capaz de se perder dentro do próprio apartamento.

O casal que entrou no carro naquela noite era de brasileiros que moravam fora do país e conheciam Sergipe muito pouco. Altair até já andara por estas bandas; Zilda estava descobrindo o lugar. Eles eram primos de Leninha. Bem, tínhamos, então, as amigas Leninha e Meire no banco da frente, Altair e Zilda, os turistas, no banco de trás.


Carro na rua, conversa animadíssima. Zilda lembrou que, naquele mesmo dia, deram voltas quase intermináveis até conseguirem encontrar o Terminal Rodoviário por onde passavam agora. Leninha, segurando o volante que nunca entregou a ninguém, matutava, silenciosa, sobre aquele fato. “Como é que eu fui me perder do Terminal? É... Cada um tem seu seu dia de tonhice na vida".

Faziam piada com as histórias de vida de cada um e assim iam afinando mais as relações. Leninha falava, ouvia, mas não tirava o olho da estrada, que lhe provocou a primeira dúvida: “Maceió, Salvador... E Laranjeiras, por onde eu sigo mesmo?” Zilda, quase num sussurro, observou timidamente: “Aquele caminhão, com placa de Laranjeiras, talvez...” Leninha já havia optado por um desvio e pronto! acabou dando uns cinco volteios no viaduto, até aceitar a sugestão do primo turista de que deveria seguir no sentido das duas outras capitais. “Ufa! Que é isso? A tonhice tá me atacando de novo?”, disse a incomodada Leninha. Zilda e Altair, no banco de trás, divertiam-se com o desnorteio da prima e a nulidade da co-piloto. As duas guias sergipanas desaprovavam as gargalhadas. 

Laranjeiras a 18 km, disse a placa, numa bifurcação. Somente agora a experiente condutora do automóvel se sentiu segura naquela noite em que tanto se surpreendia. Segura? Segura pra girar o volante pra direita! Que foi aquilo?! Zilda, no banco de trás, alertava timidamente: “Olhe a placa, veja a seta, é pra esquerda, olhe o caminhão que tem placa de Laranjeiras”. Era tarde, o carro já estava na pista errada. Marcha à ré naquele lugar, àquela hora, seria coisa pouca pra Leninha, conhecido ás na direção, mas naquele dia de tonhice, julgou melhor fazer o que nunca, antes, na história de toda a sua vida, havia feito. Passou o volante pra mãos alheias e se recolheu ao banco de trás do próprio carro. Altair, guiado pela esposa, que consolava a decepcionada motorista, tirou o grupo daquela enrascada e, finalmente, todos seguiram para a histórica Laranjeiras


Mais uns quilômetros, e o percurso foi ficando estranho novamente. “Não é possível. Laranjeiras é logo ali, e o domínio de mapas que tenho não me permite esta desorientação”, pensava a motorista sem volante. “Só pode a geografia local ter mudado”, disse a co-piloto sem função. Depois de consumirem mais algum pneu, avistaram nova placa, razão de grande alívio. Agora sim. É só dobrar à esquerda e... E agora? Zilda notou mais uma vez: “Aquele caminhão tem placa de Laranjeiras. Ele bem provavelmente...” Altair, estimulado pelas outras duas mulheres — até antes dessa aventura, supostas conhecedoras das rotas de seu estado —, fez a primeira entrada para a direita e seguiu em frente, diferente do que fez o caminhão da discreta Zilda. “Escura a pista, não é? Não me lembro disso. Está tão diferente...” Os comentários de Leninha e Meire começavam a preocupar o casal... Ôô! Acidente na pista. Viaturas de polícia, uns quatro carros civis batidos no meio daquela noite tão preta. “Seguimos em frente?” Seguiram. O chão já parecia que não ia dar em lugar nenhum quando avistaram umas luzinhas. Logo depois, uma grande estátua iluminada. “Será ali? Agora há estátua iluminada na entrada de Laranjeiras? Será o Cristo? Não é possível que a gente veio parar em São Cristóvão. Quem sabe a prefeita fez um Cristo para Laranjeiras também!” Um paredão respondeu a todas as perguntas que as sergipanas sem bússola, quase a uma só voz, faziam naquele momento. “Bem-vindos a Riachuelo”. Nããão. Tudo menos aquilo. “Mas Laranjeiras é pra este lado. Passamos pela fábrica...”, repetia Leninha inconformada. “Mas o caminhão foi pra lá, eu vi”, lembrou a quase silenciosa Zilda.

Riachuelo — entrar ou não entrar, eis a questão. Perdidas quase em casa, como se sentiam, Leninha e a amiga temia que aquele pulinho à Micareme de Laranjeiras acabasse no Rock Sertão de Nossa Senhora da Glória, o que não seria má ideia, não fosse um sinalzinho sonoro, acompanhado de uma piscadela luminosa no painel do carro, anunciando: Combustível na reserva! Combustível na reserva! Mas já haviam mesmo decidido dar meia-volta, e o nervoso local do acidente já ficara para trás outra vez. “Era só o que faltava”, exclamou Altair, enquanto se benzia. A esposa estremecia. Leninha tranquilizava os amigos: “Tem combustível pra gente voltar a Aracaju, imagine chegar a Laranjeiras”. Àquela altura, Meire fazia alguns combinados com os amigos: “Se alguém conhecido nos encontrar nesta situação, diremos que nossa intenção era mostrar Riachuelo aos turistas”. Leninha aportou na ideia e logo começou a dar uma aula sobre a história e a economia da cidade casualmente encontrada.

Chegar... chegaram. Laranjeiras, enfim. Estacionaram numa praça ao lado do caminhão, aquele de Zilda, que alfinetou, menos discreta agora: “Eu bem que disse!”

Desceram e num instante se esqueceram de todas as inconveniências, divertindo-se com as graças do desfile tradicional de blocos carnavalescos. Fotos? Tiraram todas. Tantas que os celulares que tinham ficaram sem bateria. Mas isso eles só descobririam na volta, no meio do breu, quando o tanque de gasolina foi a zero.

Clic se desea leer Palabras

sábado, 14 de maio de 2011

Um amigo é um amigo

OBRIGADA
Lula Ribeiro gravando n'A Casa do Zé
Foto: Aglacy Mary

Quando um amigo lhe empresta a voz, 
você descobre que ele é mais amigo.


Foto: João Ricardo


sábado, 30 de abril de 2011

Foi


Era flor.
Quando vi
era doce.
Quando vi
era vinho.
Perdi a flor.
Perdi o doce.
Derramei o vinho.

quarta-feira, 27 de abril de 2011

domingo, 24 de abril de 2011

Tuas romãs

Foto: Emerson Vasconcelos 
(que sabe aproveitar uma manhã de chuva)

Se fosse teu o meu beijo,
Seriam minhas tuas romãs
E lhes esmagaria as sementes
E lhes roubaria o suco
Que deixaria a fermentar.
Se fosse teu o meu beijo,
Do pálido rosa ao vermelho rubi,
Tuas romãs se fariam vinho,
Suave e delicado, a derramar-se 
Na brancura dos lírios da barra
Dos meus lençóis de carmim.

sábado, 23 de abril de 2011

Ressurreição (ou Esperanças na prateleira)


Orgulhosos, descobrimos outro caminho.
No ponto mais alto, sujeitos protegidos do sofrimento:
de um lado, um eu preparado para a desatenção;
do outro lado, um eu que dispensa cuidados.
Ergue-se nova prisão: o paradigma de desconfiança,
cujas paredes são feitas desse espírito comercial da vida íntima.
Como alimento, a ressurreição diária de nossos desejos
através de renovadas promessas,
contidas em inéditos kits identitários.

sexta-feira, 22 de abril de 2011

Historinha atual de casas grandes e senzalas

Chovia a moça, quieta. 
Sorvia pelas frestas 
Os aromas do terreiro. 
E,vinda longe, ouvia 
A voz desconcertante do vaqueiro.

Quer ler uma história? Para sempre.

Meia taça de lua


o doce
depois da vindima

Ler uma história? Gota d'água.

terça-feira, 19 de abril de 2011

De não saber

De brincadeira

De não saber

dou-me a dizer.
De tanto dizer
às vezes penso que sei.


Gosta de histórias? Pela hora da morte.

domingo, 17 de abril de 2011

Florquesou



Sou 'alamanda amarela' (Allamanda cathartica): comum por estas bandas e capaz de existir no mundo inteiro. Suas sementes são numerosas, mas ficam dentro de frutos do tipo cápsulas. Gosta de sol. Eficiente, de modo discreto, no combate a certas pragas. Seus ramos são tão flexíveis que podem enrolar-se em si mesmos. Assim pode até parecer o que não é.


Provocação de Nena.

sábado, 16 de abril de 2011

O mais rico dos reinos


Conto criado para o Projeto 2008 da Nossa Escola: "A Palavra Guarda o Mundo".


Em um reino muito distante daqui, havia grande riqueza escondida, à qual nenhuma outra se comparava. Durante os tempos, era o que se dizia, mas ninguém de fato conhecia o tesouro do rei Solécios.

Pelo valor que se atribuía aos bens, outros reinos já haviam planejado empreender batalhas, mas desistiam porque não logravam descobrir onde era guardada tanta... talvez incontáveis dobrões de ouro.

O povo não parecia mesmo viver em um lugar provido de tantos bens. A todos parecia que faltava luz. Olhos sem expressão, sorrisos vazios, sins e nãos sem razão. Apenas o rei e os membros de sua corte desfrutavam de parte do que possuía e que ficava trancado a sete chaves três vezes, em uma das salas de seu gigantesco palácio.

Assim foi durante muito tempo, tanto que o calendário não consegue contar, até que, num dia comum, em que os camponeses semeavam a terra, cultivavam sementes e colhiam frutos para entregá-los, todos, ao rei, as trombetas soaram da torre mais alta e anunciaram que o trono estava vazio. O rei Solécios morrera.

Esgotada a reserva de lamentos – nunca se ouvira tantos ohs! e ahs! – chegara o dia da coroação do novo soberano. Alguém daria rumo àquela gente. Naturalmente, assumiu o trono o príncipe Filos, único herdeiro do rei morto.

Logo após a festa da coroação, o chefe da guarda trouxe uma má notícia: o rei de umas terras vizinhas aproveitou-se da nova situação e, acreditando na fragilidade do herdeiro de Solécios, determinava que, no prazo de dois dias, confiassem-lhe seus bens. Fazia tal exigência alegando que tudo o que parecia ser do reino de Filos havia sido roubado de seu reino, há muitos e muitos anos. E concluiu dizendo que decretaria guerra entre os dois territórios, caso seu desejo não fosse atendido.

Filos estava certo de que não poderia contar com vantagens de seu exército, pois seus soldados eram em menor número. Pedir ajuda ao rei das terras ao sul de seu país de nada adiantaria, pois, pela distância, a ajuda só chegaria quando nada mais houvesse a fazer. Ele não tinha dúvida de que deveria proteger seus súditos, mas desejava fazer isso de modo a não haver derramamento de sangue. Que estratégia usaria?

Ao final daquele dia, sob uma lua de cristal, a Filos foi anunciada a presença de Selena. A bela moça de olhos marrom-tâmara tinha um segredo a revelar. Neste encontro, o rei soube que o argumento de seu adversário era verdadeiro. Sua riqueza não era legítima. Lembrou-se então do pequeno baú com que a mãe o presenteara quando ele era criança ainda, beirando os cinco anos. O conteúdo do baú era, verdadeiramente, a maior riqueza que possuía, mas pela qual seu pai só se interessara em parte. Considerando isso, Filos decidiu entregar ao adversário a caixa e seu tesouro.

O encontro foi marcado. Na hora combinada, os dois cavaleiros estavam no meio da ponte erguida sobre o rio que dividia seus domínios. De um embornal, o rei Filos retirou o precioso objeto como prometera. Desapontado com o tamanho do baú, seu adversário ameaçou guerra novamente, caso não ficasse satisfeito com o tesouro ali contido. Ao abri-lo, o que fez bruscamente, um facho luminoso espalhou-se por toda aquela região. No ar, aquela luz foi tomando forma de palavras, que se uniram formando três frases. O rei que proclamava guerra, paralisado pela surpresa, viu que a primeira frase dizia: “Ouça a palavra”. Na segunda, leu: “Pense na palavra”. A terceira frase concluía: “Faça a palavra”.

Cada um dos monarcas voltou às suas próprias terras e encontrou seu povo diferente. Naquelas paragens, onde antes quase não se via prosa, agora havia até poesia; onde antes os sábios guardavam segredos, agora contavam histórias de coragens e medos; onde antes as palavras, trancafiadas dentro das mesmas pessoas, causavam até indigestão, agora se viam soltas. Às vezes, faziam silêncio, às vezes não. Umas palavras ouviam as outras e, juntas, faziam nova palavração.

Agora é a sua vez.
Cada um tem seu baú
E pode descobrir, lá no fundo,
Que a palavra guarda o mundo.

Mas antes fique sabendo que o rei Filos ficou agradavelmente surpreso com a atitude de Selena, por quem se apaixonou. Logo lhe propôs casamento, e ela lhe respondeu com uma palavra de apenas três letras. Como dizem as boas histórias, se não morreram, estão vivendo felizes até hoje.


Conto criado para o Projeto 2008 da Nossa Escola: "A Palavra Guarda o Mundo".
Você também pode gostar de ler, para adultos, Roteiros.

quarta-feira, 13 de abril de 2011

Eu, por mim...



"É tempo de murici,
cada um cuida de si."
I don't care, I don't care.
É mentira, pois eu quero
saber o que você sente, 
sentir o gosto do povo.
It is not my business.
O problema é de quem fez.
Mais mentira! Eu dispenso
o que diz o seu inglês.
Tamarindo em Canudos,
quando viu fechar o tempo,
azedou-se em covardia
e começou o movimento:
Um por todos? Nem pensar
Todos por um? Pode esquecer.
"É tempo de murici,
cada um cuida de si."
Eu, por mim,
ainda teimo em compartir.

domingo, 10 de abril de 2011

Com tensão

Sem tensão / Foto:Aglacy Mary


Não lhe peço nada
Se veio aqui, terá somente a dor
E o calor de meu desejo
Que a ninguém mais interessa
Não tenho calma
Minh’alma se apressa
De sair da linha
Romper estâncias
Sem tempo para chegar
Nem lugar
Não lhe quero nada
Não me quero dada
Se pode, rasgue a contenção
De minha palavra
E percorra-a, farta
Louca
Amarga


sexta-feira, 1 de abril de 2011

Se a mim me parece...

Carnaval de rua / Foto: Aglacy Mary


Eu minto 
quando digo que isto é aquilo,
mesmo carregando comigo a crença 
de que isto é realmente aquilo?

domingo, 27 de março de 2011

A lavra

Lá, do outro lado de lá
Foto: Aglacy Mary


O que me delineia e localiza
É seu olhar
Seu não desvio da letra
Que desenha meu mundo
E me dá posse de bom punhado

Sei que sou
Porque me vê
Distingue-me da moldura
Das cenas circundantes
Descobre-me a pele
Toca-me a ferida
Recolhe-me o sangue

O que me multiplica e perpetua
É a lavra da pá
Submetida à intenção
Que se sabe nascida
E nunca se vê
Findada
Fincada
Recolhida


Espie também Ensaio Olhográfico